Parto na Alemanha

Relato de parto na Alemanha

Quem me conhece sabe que sou uma mulher intensa. Se é para viver algo eu me jogo e vivo intensamente. Com a gestação não foi diferente. Eu amei estar grávida! Curti cada dia, cada enjoo, a barriga crescendo, o bebê chutando, os preparativos, a escolha do nome, os cuidados com o quartinho, como eu iria contar para cada familiar e amigo e tantas outras coisas legais e especiais que a gente passa. E neste post vou contar um pouquinho sobre como foi o parto na Alemanha.

Você é mais forte do que imagina!

Eu sempre falei para o meu marido: “Amor, imagina que legal se eu conseguisse ter um parto normal bem wild assim… mas eu acho que não vou conseguir porque sou muito sensível a dor” e ele sempre respondia que eu poderia sim conseguir e que eu poderia tentar.

Eu realmente achava que eu não conseguiria tanto que depois que fiz o meu cadastro no hospital em que eu escolhi parir eu já assinei todos papeis para tomar anestesia.

Tentei me informar e pesquisar os hospitais ao máximo porque eu tinha medo que essa experiência virasse um trauma. Ouvi muitos relatos traumáticos então eu espero que com esse meu relato eu passe algo de positivo para quem está grávida, para as tentantes ou para quem pensa em um dia ficar grávida. Meu objetivo não é romantizar a gravidez ou o parto e sim mostrar que isso pode ser levado e vivido de uma forma leve e feliz.

“Mas credo, cadê a Maia?”

Até as 38 semanas eu ainda estava curtindo muito estar grávida. Eu continuava dormindo bem e sem dores. Mas quando começou a 39a semana eu comecei a querer o meu corpo de volta. Quando eu falo isso é porque eu já não conseguia fazer nada direito porque a barriga estava enorme e eu não tinha a mesma energia.

Teve um dia durante o banho que eu falei com a Maia na minha barriga. Disse que ela poderia vir quando ela quisesse e que por mais que eu tivesse medo de sentir saudades dela na minha barriga eu já estava ansiosa para gente curtir juntas do lado de fora. Chegamos em 40 semanas e nada dela nascer.

Todo mundo me perguntando: “mas credo, cadê a Maia?”. Dependendo do dia eu não me importava em responder isso, mas tinha dias que eu já estava muito ansiosa e sem saco para ficar falando que ela ainda não havia nascido e que isso era normal porque a maioria dos bebês nascem depois das 40 semanas. Eu cheguei a me sentir culpada porque a Maia ainda não tinha nascido.

Bebê a caminho – A bolsa rompeu!

No dia 5 de julho de 2022 completamos 41 semanas e nada da Maia vir. Nesse dia andei bastante, subi e desci escada e até falei para o meu marido que eu tinha visto no Instagram da @samdoula que se a gente pressionasse um ponto do meu mindinho do pé isso poderia me ajudar a entrar em trabalho de parto. Mostrei o vídeo para ele e resolvemos fazer antes de dormir. Deitei às 22 horas e eu estava muito inquieta. Parece que estava sentindo que algo iria acontecer, até que 00h46 do dia 06.07.2022 a bolsa estourou!

Senti algo quente escorrendo pelas minhas pernas. Acordei no susto e falei muito feliz: “Amor, a bolsa estourou! A bolsa estourou!”. Levanto da cama e fico parada até que falo: “Nossa, está pingando no chão!” nisso o Rico responde: “Então, já vai para o banheiro!”.

Tomei banho, coloquei uma fralda adulta porque ainda estava saindo bastante líquido e depois de mais ou menos uma hora comecei a sentir as primeiras contrações. Olhei para o meu marido e fizemos uma dancinha de empolgação comemorando que hoje seria o dia do nascimento da nossa filha! Pedi para ele voltar dormir para ter energia para o parto, mas antes ligamos para o hospital para avisar que a bolsa já tinha rompido. A hebamme (parteira) de plantão falou que se as contrações não ficassem ritmadas a cada 5 minutos até as 11 horas da manhã a gente teria que ir para o hospital mesmo assim.

Contrações ritmadas – Hora de ir para o hospital e começar o Parto na Alemanha

Quando o relógio marcou 5 horas da manhã a dor ainda não estava forte e era mais nas costas e não mais como a cólica menstrual como no início das contrações, mas ela já estava vindo a cada 5 minutos! Acordei meu marido, ele se arrumou, tomou café da manhã, ligou para o hospital avisando que estávamos a caminho e as 06h06 do dia 06 lá fomos nós viver intensamente esse tão esperado momento!

Tiramos a última foto com a Maia na barriga antes de sair de casa, afinal, na próxima ela já estaria nos nossos braços! No caminho conseguimos ficar bem calmos e eu estava focada na respiração.

Entrada no hospital

Chegamos às 7h da manhã no hospital e as dores começaram a ficar ainda mais intensas. Assim que entramos no hospital eles nos direcionaram para uma sala “pré parto” que só tinha uma cama (maca) de casal. Fizeram teste de COVID em mim e o meu marido não precisou fazer porque ele tinha feito um PCR um dia antes. A hebamme (parteira) que nos direcionou até a sala já veio me abraçando e perguntando como eu estava. Nesse momento já me senti acolhida e muita confiança nela porque toda vez que ela falava comigo ela também falava com os olhos, afinal, ela estava de máscara devido a pandemia. Entramos na sala e ela nos informou que eu poderia beber e comer o que e quanto eu quisesse. Ficamos sozinhos no quarto e de tempos em tempos vinha ver como estávamos.

Logo que cheguei a hebamme também fez o exame de toque para medir a minha dilatação e para a surpresa de todos eu já estava com 6 centímetros. Ficamos chocados porque eu estava conseguindo lidar muito bem com a dor. O que eu não conseguia fazer era sentar ou deitar porque sentia muita dor. Fiquei em pé balançando o quadril para os lados e quando vinha a contração eu me apoiava na parede e chamava o Rico para pressionar minhas costas.

Ressignificando a dor

Depois de umas 2 ou 3 horas mudamos para a sala de parto e a hebamme veio medir a minha dilatação novamente porque os gemidos estavam ficando muito altos. Nessa hora perguntei se eu podia entrar na banheira porque eu não estava conseguindo relaxar e descansar entre uma contração e outra, afinal, eu não conseguia sentar nem deitar.

Antes de entrar ela perguntou se poderia ver a minha dilatação novamente para ver se eu ainda poderia entrar e eu já estava com 8 centímetros! Fiquei muito feliz e nesse momento pensei: “se eu quiser tomar anestesia é agora ou nunca. Bom, 8 pra 10 é só dois, então eu acho que eu consigo! Não vou pedir anestesia!”. Nessa hora o meu marido pensou a mesma coisa e o que ele me contou depois foi que ele não quis me lembrar que existia essa opção porque isso poderia interferir as minhas decisões. O agradeci por isso porque realmente fez sentido e isso demonstrou que ele confiava em mim e sentia que eu era capaz.

O início do parto na Alemanha

Entrei na banheira só com um top e com o CTG na barriga e finalmente eu consegui relaxar de verdade nos intervalos das contrações. Meu marido continuou apertando minhas costas e me motivando sempre que vinha a contração. Até que chegou o momento que eu sentia meu corpo fazendo muita pressão para baixo. A hebamme falou que eu poderia deixa o corpo fazer sozinho mas que eu ainda não deveria fazer força junto. Perguntei o que acontecia caso eu fizesse cocô na banheira, a parteira e ela falou que não teria problema. Meu marido engraçadinho falou: “relaxa que a gente faz pesque e pague” eu dei risada e na próxima contração me entreguei totalmente ao que meu corpo estava pedindo.

Informação importante: é super normal e comum as mulheres fazerem cocô durante o parto. Até ajuda a “liberar o caminho” porque dai tem mais espaço lá dentro. Eu não vejo problema nenhum em meu marido ver tudo isso, afinal, ele também faz cocô e isso faz parte do processo! Mas se você não se sente confortável com isso eu recomendo você conversar com seu parceiro(a) para você se sentir melhor e entender que isso é algo natural e que faz parte do processo. Se você ficar na cama as hebammes limpam tudo com muito mais agilidade e às vezes você nem percebe que fez cocô.

Concentração e força

Durante várias contrações eu me agarrava em um pano que estava pendurado no teto e vocalizava: “Ahhhhhhhhhhhhhh!!!” e deixava o meu corpo fazer o que ele estava pedindo: força! Quando essa pressão começou a ficar mais intensa e frequente a parteira pediu para que eu largasse o pano e que eu deitasse na banheira e dobrasse as pernas para que eu pudesse fazer força junto com a contração. Ela também me pediu para tirar o top que eu estava usando para o meu marido ficar jogando água nos meus seios porque isso faria o meu corpo liberar oxitocina. Nisso já dava para sentir a cabeça dela – ainda dentro de mim – até que ficamos muito tempo na fase de expulsão sem nenhuma evolução. A cabeça da Maia estava quase saindo, mas quando passava a contração ela voltava.

Pedi educadamente para o meu marido ficar quieto porque eu queria me concentrar e ser guiada pela hebamme. Vieram várias contrações, fiz muita força, respirei, gemi e nada! Ela pediu para eu tentar fazer força mais uma vez e se nada mudasse eu teria que ir para a cama por uma questão de segurança. Tentei fazer mais força e nada! Assim que passou a contração eu sai da banheira, eles me secaram um pouco e fui direto para a cama.

Não existe posição ideal

Tentei ficar confortável em várias posições, me agarrava no pano pendurado no teto, virava de um lado para o outro, mas nenhuma posição parecia funcionar. Eu estava muito perto de parir! Conforme o protocolo, nessa fase a médica entrou na sala por segurança. Ela ficou sentada só observando. Já tinha passado mais de 2 horas da fase expulsiva mas a hebame e o meu marido estavam tentavam sempre me motivar. Falavam que eu estava indo muito bem mesmo que os batimentos da Maia estavam ficando mais altos (essa informação eu só soube depois do nascimento) até que a parteira falou com a médica sobre a manobra de Kristeller para empurrar a minha barriga um pouco para o lado porque ela achava que era isso que estava dificultando o nascimento da Maia.

A importância do parceiro no parto

Quando o meu marido ouviu ele já interviu e falou que eu não gostaria disso – tá ai a importância do seu parceiro(a) estar ciente de todas as suas vontades durante o parto – então eles me deram a opção de tomar oxitocina na veia e eu aceitei. Fizeram isso muito rápido porque o coração da Maia estava batendo mais rápido. Ela tinha que nascer logo! Nesse momento a parteira falou: “Juliana, eu sei que você não quer que eu abra a gaveta para usar as outras ferramentas para te ajudar, então vamos lá, você consegue, falta pouco. A Maia precisa nascer logo!”. Me concentrei, fiz mais força… e nada mudou!

Então ouvi a hebamme falar para a médica: “Scheiße! (merda) Não mudou nada!”. Percebi que o negócio estava ficando sério. A hebamme me perguntou mais uma vez se eu não queria deixar a médica empurrar um pouco a minha barriga. Ela me explicou que a médica faria isso, que ela sabe o que está fazendo, que não seria violento e que não vai doer nem nos machucar.

Nesse momento eu já estava muito cansada e só fiz que sim com a cabeça. Então a hebamme e o meu marido seguraram uma perna e eu e a médica a outra. Eu me curvei e fiz muita força e a médica deu um empurrãozinho com a mão, eu fiz mais força, mas ainda não mudou muita coisa até que na próxima contração ela pediu autorização para fazer força com o antebraço e eu autorizei.

Senti a minha filha pela primeira vez

Ela fez um pouco mais de força e nisso eu fiz força junto com a respiração e dei o meu grito mais alto: “Ahhhhhhhhhhhh…!” fiz muuuuuuuuita força e…….. saiu a cabeça!!! Todos comemoraram e a hebamme colocou minha mão na cabeça dela e senti a minha filha pela primeira vez! A hebamme me lembra: “Agora falta pouco! Você consegue!”. Isso me deu mais força para a próxima contração! Fiz mais umas 3 forças durante a próxima contração até que ela nasceu e veio direto para os meus braços! Foi nessa hora que eu, o meu marido e a Maia choramos juntos! Que emoção de olhar, pegar, sentir a nossa filha pela primeira vez! Todo cansaço do parto se transformou em amor.

Foi o meu marido quem cortou o cordão umbilical depois que ele parou de pulsar. Depois a Maia foi para o colo dele e eu tive que parir a placenta. Sim, você tem que parir isso também! Eu tive uma última contração e ela saiu sozinha. Eu levei alguns pontos e depois já fui para o quarto.

A mulher mais poderosa do mundo

O sentimento de parir e ter a Maia em meus braços foi surreal. Me senti a mulher mais poderosa e – com o perdão da palavra – FODA do mundo! Falei muitas vezes “eu não acredito que eu consegui! Estou tão feliz! Ela é tão linda!”. Eu e o meu marido chorávamos de emoção, nos beijávamos sem acreditar que ela finalmente estava no nosso colo. Nossa relação de marido e mulher foi para outro patamar! É um nível de admiração, respeito, amor que eu nem sei explicar. Eu olhava para o ele, olhava para ela e chorava. Com o ele a mesma coisa. Ele me falou diversas vezes “Mozita, você é foda! Estou muito orgulhoso de você! Você me deu o melhor presente”.

Uma das músicas que eu ouvi muito durante a gestação foi uma da Mariana Nolasco chamada Transforma(dor) e no refrão ela fala: “Transformador, transforma a dor em toda forma que houver de amor”. E isso resume muito do que eu pensava e o que eu vivi no parto. Eu não via a dor do parto como uma dor ruim. É uma dor para trazer a minha filha ao mundo. Ressignifiquei a dor do parto antes mesmo dela acontecer. Quando me perguntam se não doeu muito, é claro que doeu, mas como tinha os intervalos das contrações para me recuperar eu decidi tentar sem anestesia e deu tudo certo!

Partolândia

Em momento algum eu perdi a consciência ou fui para a “partolândia”. Durante todo o processo senti minha mente silenciada. Não passava nada pela minha cabeça. Eu só estava atenta aos comandos da hebamme. Eu nunca me concentrei tanto na vida! Para quem não sabe eu sou bem avoada e volta e meia eu estou no mundo da lua, mas nesse dia eu estava 100% presente, focada e determinada. A hebamme e o meu marido me falavam toda hora: “Você consegue, você é capaz, estamos quase lá”. Me sentir segura, acolhida e confortável foi essencial para eu ter conseguido me entregar ao processo.

Relato de parto na Alemanha- pelos olhos do pai

Foi emocionante, intenso e diferente de como eu imaginei. Eu achava que as fases do parto seriam mais nítidas de quando começa e acaba. Também achei que a Ju iria esquecer o alemão e para a minha surpresa ela entendeu quase tudo e também respondia a hebamme em alemão. Deu muito orgulho em ver quão forte a Ju foi.

Eu achava que eu seria meio inútil durante o parto, mas como a minha tarefa era de fazer a pressão nas costas da Ju eu conseguiu participar ativamente do processo, afinal, eu tinha alguma tarefa além de ficar ao lado dela segurando a mão e a motivando.

Em momento algum eu tive nojo ou agonia do que estava acontecendo, muito pelo contrário, eu tive que segurar várias vezes o meu choro de emoção sempre que eu a incentivava e falava que a Maia estava prestes a nascer.

Quando a nossa filha nasceu eu senti uma mistura de alívio e felicidade pelas duas estarem bem e por não ter sido necessário qualquer outra intervenção porque a Ju não queria isso. Depois eu fiquei surpreso que ela estava plena nos primeiros minutos após o parto! Não dava para ver que ela estava exausta e nem que ela tinha acabado passado por um parto. Eu recomendo os parceiros(as) a comerem bem antes do parto e tentarem descansar o máximo possível porque a gente precisa passar toda a força e segurança para a mãe, além de saber todas as vontades dela em relação ao parto para que você possa intervir.

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Juliana é brasileira com descendência árabe e portuguesa. Casada com um alemão, vive em Munique. Esse misto de culturas a transformou na mulher que é hoje. Intensa, sensível, família, alegre, comunicativa, prática e determinada. Ama viajar e se emocionar com a energia de cada lugar e pessoa. Foi durante a sua viagem de intercâmbio que começou a escrever um diário e então percebeu que a escrita era uma ótima maneira de se expressar, de se curar e de registrar momentos. Instagram @julianatorresberg